domingo, 27 de março de 2011

Dançando num cerrado alcoolizado.




O Senhor-rapaz:Me diga quem és tu, primeiro, tu que tens nome de flor...me mostra o que existe além desses dentes a mostra e desse balançar de cabelos...O que existe por trás, dessa tua euforia nervosa de carnaval?

A Flor:Por favor, meu senhor, é carnaval! E eu só quero poder cantar essa noite sem olhar pra mim mesma, então não me perguntes. Me diga, tu, quem és...tão envolvido com essas sombras noturnas e com as luzes que te embaraçam os pensamentos!


O Senhor-Rapaz: Tire suas mácaras, pequena flor, tire esse rosto bonito e me deixa ver,
o que é ainda mais bonito: as suas cicatrizes estampando a sua estrada. os seus sonhos colados no sorriso aberto.
Consigo ver o oceano nos seus olhos, tão negro e profundo quanto o seu coração.

A Flor: É carnaval e eu estou saudosa, senhor.Sinto falta de quando acreditava no eterno retorno. Eu só queria que me desse o seu fumo, senhor. Não precisa me lembrar destas cicatrizes.

O Senhor-rapaz: Pegue o fumo, beba mais uma dose de delírios alcóolicos, sonha teus sonhos nesse remexer de cabelos ondulantes, que ondulam os meus pensamentos. Me diz, onde está o teu rei, que te consomes? Porque teu pensamento é longinquo, como essa estrada embriagada...

A Flor:O Meu Rei, senhor, está distante...distante de mim! Ele nem sequer segura mais a minha mão, e eu já chorei. Não choro mais. Tenho acreditado, senhor moço, que o delírio é se entregar a crença do eterno, os reinados vem e vão, o que fica é o coração, amontoado de sentidos. O Rei morre um dia, eu morro um dia, tu morres também. O coração, amargura, o desejo, a loucura, permanecem embebedando meu cérebro.

O senhor-rapaz:Vira-te e olha pra mim, não te tornas tão fantasmagórica, entrega-te logo a esta dança, tu que és cigana e flor..e dança a vibração desse momento, antes que a dor te devore por completo. Não te deixas perseguir pela loucura do tempo. Espera que o tempo te devolve o que é teu. E o tempo te move pra sentir tudo que deve ser sentido.

-Hoje

-Ontem

-Agora.

A flor:Me diz, meu senhor, porque te entregas assim as palavras? tão docemente como se quisesse me catequizar? Sempre falas isso as flores que encontra? Ou encontraste alguem com quem consegues te confessar?

O senhor-rapaz:Ouça bem, pequena flor, eu sei quem tu és. Consigo fitar os teus sentimentos...essa ansia por voar, esse desejo de ir além das palavras...esse medo de superficie.. e te digo: entego-te tao facilmente as palavras, porque me vejo cristalizar as idéias com as tuas formas distintas. Então, não fuja, nesse mundo de idas e vindas, de estradas e calçadas, os encontros se destinam a nos dar respostas.

A flor: Então me responda, o que queres daqui? desse carnaval?

O senhor-rapaz: Sentir o cheiro. E tu?

A flor: Sentir o aroma... sentir os rostos. sentir as forças que vibram indo e vindo com essa música que toca. Sentir o alcool desentupindo a ansiedade dos medos futuros.

O Senhor-rapaz: Tá vendo! Sinto o cheiro da flor do cerrado me dizendo que tem medo que o vento a leve , despedaçando-a. Leve és, e leve a sinto.

A flor: Então sinto olhos que veem além, como poesias que servem de oráculo. Até parece que estou lendo meu horóscopo, me dizendo as palavras do dia. Parece cachoeira inundando meu corpo. Sinto cheiro de verdade, cheiro de erva viajante. e que viagem, meu senhor! Mais uma vez se encontraram as palavras...

O senhor-rapaz: Então, não se vá tão rápido...antes que a estrada nos afastde de uma vez e faça deste encontro um único momento. vem, e segura minha mão! Fecha os olhos, segura minha mão, e sente a harmonia que é sentir que esse mundo é feito de eus, de voce, de todos...e nos fazemos um pouco mais cada vez que nos encontramos com outros eus. eu, voce, os outros... as flores, os aromas, as ervas, os ardores, os amores...

A flor: Então abre teus braços sonhador, fecha teus olhos e tira esse nervosismo de mim. só essa tua calma, me acalma. como um abraço paternal.

O senhor-rapaz:Então me deixe te soprar, pequena flor, deixe que eu sopre esses medos. Num sopro, eu poderei sentir em mim, pedaços dos teus sonhos, pedaço da tua doce existencia em sonhos. Durma tranquila agora. Que a lua segue bonita, aqui e aí.



Conto-delírio escrito por mim e por um rapaz espertinho que por sinal desafiou minha esperteza. Em uma dessas noites alcóolicas de trocas de palavras virtuais, memorizando certos momentos carnavalescos.
Obrigada menino dos sopros, por me tranquilizar ao comprtilhar de devaneios.

Calli.

Nenhum comentário: