domingo, 15 de novembro de 2009

A dor sem Memória




Existia,há alguns milhares de quilômetros dali,uma mulher,quase enlouquecida,pertubada em seu próprio sentir,ainda que aparentemente normal.
Era jovem,ainda que se sentisse tão velha.Era doce,ainda que se enxergasse tão amarga.Era na verdade ainda uma garota,que ouvia velhas canções dos anos 80 e lia poesias antes de dormir.
Seus olhos possuíam um brilho estranho,como se a qualquer momento fossem expelir um rio,mas ela sempre os mantinha fortes,imponentes,como ela costumava parecer.
Aquela mulher tinha um Amor.Houve alguém que há tempos a fez sentir algo no qual ela já desacreditava em toda a humanidade,pois,para ela,era difícil sentir a profundidade das pessoas.Conheceu um ser realmente profundo e puro em suas qualidades essenciais.Era este o ser mais belo que já encontrara.Aquele com o qual ela compartilhou seus pensamentos guardados,sonhos,medos,olhares...
Foi então quando ela se sentiu realmente feliz e completa em sua totalidade,quando ela sentiu que nada mais lhe faltava,que nada mais precisava,bastava ouvi-lo,senti-lo,te-lo ali,completamente em sua Alma.
Ela o amava com toda a sua força;Ainda que distante,ela o sentia e vivia tal sentimento mesmo que os medos lhe cortasse, por dentro.Não hesitou verbalizar,pois era tão natural,não hesitou desejar faze-lo sentir o mesmo.Queria faze-lo tão bem quanto ele o fazia e assim buscou fazer...
Ela ouvia a sua voz e se sentia assim como uma criança após ganhar um doce.Poderia fechar os olhos e adormecer feliz,pois sabia que a mais importante alma preenchia a sua vida e habitaria seus sonhos para sempre.Era a única certeza de sua vida,tão feroz e tão evidente em cada pensamento seu.Mal via aquele rosto,pouco sabia de como era fisicamente o seu amor e os seus passos longe dali,porém o sentia tão intensamente,como nunca havia sentido alguém.
Porém,houve um acidente,um desses ferimentos graves em que é difícil estancar o sangue que escorre.Aquele ser solitário do outro lado da linha,aquele nobre ser que unia arrogância e doçura,era tão duro consigo mesmo,e tão sensível paradoxalmente.Ele não conseguia deixar de sentir-se sozinho,não se senti preenchido,não sentia,ainda que quisesse,o desenfrear de seus pensamentos na pureza do sentimento de plenitude.Ele a amava de verdade.Amava seus olhos,seus pensamentos,sua voz,seu ser.mas sentia,dentro de si,que ainda estava sozinho.
Ela lhe entregou o coração,medrosa e verdadeira,sempre esperando o mesmo tom de “Eu Te Amo” ao telefone.Mas temia exigir demais,temia estar fazendo mal,mas simplesmente sabia que não deixaria aquilo que sentia por nada.
E ele sabia que não podia lhe fazer mal e nem queria.Ele entendia o seu sentir,sabia que amava mas sabia da sua própria existência solitária ali.
Então,ele jamais a enganou.Dentre algumas palavras ditas tão sinceras,quando foi rasgada a realidade diante dela, ela então se machucou e pensou que seu Oceano estava transborando enquanto do outro lado,só havia um lago.Ela pensou ser tão boba,pensou que aquele ser jamais entendeu a profundidade do seu amor.Pensou ser enganada por um sonho distante.
Naquela noite,as lágrimas transbordaram,os olhos não se conteram,nem mesmo aquele coração.E ela decidiu apaga-lo de tudo.Resolveu ir embora do mundo daquele ser.E desapareceu.
Há pouco tempo soube que aquela mulher resolveu apagar suas lembranças.A magóa que sentia de ter entregue um amor ao único ser que enxergava verdadeiramente sublime,ultrapassava seus limites de pensamentos e não conseguia viver mais nada que não fosse as lembranças da dor que sentia.
Foi enlouquecendo por dentro,ouvindo a voz do alguém nas vozes de outros,procurando um rosto distante em outros rostos,procurou senti-lo em outros e apenas mutilava-se.
Ninguém jamais tiraria aquilo dela.E ela jamais sentiria o mesmo por alguém,pois afogar-se em Amor,só acontece uma vez.Não há como voltar.
Foi então que aquela jovem mulher decidiu perder a memória.Como num feitiço,numa magia triste,ela desejou nunca mais lembrar.Numa hipnose dos sentidos,ela foi apagando de si,os resquícios da dor eterna.Mudou-se.Mudou as roupas,os sapatos,os discos,os livros...todos jogados em caixas num porão.
E a amnésia da dor completou-se.
Aquela garota de belos cabelos continuou a viver.Acordava todos os dias para sua rotina e agora estudava mais.Queria ser gente ‘normal’,como julgava todos os outros ao seu redor.Sorria pouco,chorava pouco,enxergava pouco e sentia pouco.Era agora vazia como os rostos daquela enorme cidade.
Porém, com o passar dos dias sem a luz do sol,ela percebeu que a dor não se foi.Apenas mudou.
A jovem moça se olhava no espelho e nada conseguia ver,tentava incessantemente lembrar porque seus olhos eram tão tristes.Tentava entender porque havia cortado seu cabelo.Conseguia de longe lembrar que antes eles eram longos.
Num outro dia ela ouviu uma música açucarada que lhe era familiar.A melodia nostálgica,a fez desabar.Não conseguia lembrar o que aquilo significava,mas sentia que significava muito.Dormia angustiada,pois sabia que aquela dor era a pior já sentida.A dor de não ter memórias.Ainda que tivesse desejado aquilo,não sabia porque,porq quem e como,apenas sentia o pesar de seu próprio existir,agora tão vazio,pois apagou as lembranças do sentir a plenitude.
Eu me pergunto então:O que será pior? Esquecer a dor ou sentir a dor do esquecimento? Eu sei que tenho a resposta.O Amor é então o sofrimento mais belo e amar somentte por amar nos faz preenchidos ainda que não possamos preencher um outro espaço.Pode ser triste,mas a verdade é que é doloroso encontrar-se oco,quando já se foi realmente completo e realmente uma existência elevada em essência, diferente do que compreende sentimentos descartáveis.
Aquela mulher agora sofria um pouco mais.Procurava entender o que aquela triste música lhe significava.Buscava naqueles rostos algum traço que reconhecesse,chorava ao ouvir uma voz familiar e não lembrar do que ouvia.Apenas Sofria.Sem mais reconhecer o sentir do amor antigo e a dor antiga.Sofria por tentar ser igual a todos os outros.Sofria por seus pesadelos serem nublados.
Sofria ela por ter desejado apagar lembranças que jamais deixariam de estar ali.Jamais haveria o esquecimento completo do verdadeiro Amor.O sentir desse mesmo é tão complexo quanto a eternidade e os ciclos de uma existência.
A jovem não conseguia ignorar o fato de que sua dor apenas aumentava e a fazia cair,mais a cada dia.O esquecimento da dor nos torna então desfragmentados.Porque apenas aqueles preenchidos de dor são preenchidos de pensamentos,vivencias e do sublime Amar e contemplar o sentir,é esse realmente o conhecimento do sentido do propósito de existir.
Ela então,magoou-se consigo mesma,por sentir-se tão fraca e egoísta em querer jogar fora de si sua própria essência.Desconhecia-se,desconhecia a pureza de seus olhos,as palavras ditas,os sorrisos dados,tudo que lhe fez essencialmente feliz.
Amargurada,ela decidiu matar,não as memórias,mas o seu corpo para ela inútil;Vestiu uma velha calça de uma das caixas jogadas no fundo do armário,calçou um velho tênis e correu para longe dali,onde havia um rio.
Ao chegar ali e ver aquele rio cheio, encheu-se novamente de lágrimas,como em todas as noites e chorou mais do que em todos os dias,doendo existir tão sozinha, pois nem as lembranças tristes a acompanhavam.Eram belos os olhos encharcados da menina,a música de dentro dela, a melodia triste da dor.Ela pos as mãos no bolso como num surto de razão,já mais perto do rio.Encontrou ali,um único papel enrolado.Havia um número de telefone amassado.Ela conhecia aquele número decorado em sua mente,reconheceu cada um e sorriu delirante,porque de repente a lembrança de digita-los lhe apareceu.
Entre as lágrimas nos olhos e o vento na pele,ela logo lembrou da voz ao telefone,e ao olhar os seus pés,viu as letras escritas na borracha do tênis velho,as letras que lhe lembraram um nome,além do seu.Mal conseguia respirar e a dor aumentava a cada espectro de recordação.Lembrou então do porquê gostava tanto daquela música, agora fixa em sua mente.Lembrou de filmes,das conversas e de cenas qu a faziam chorar e chorou ainda mais.
Como se desejasse doer mais um pouco,olhou para o seu próprio rosto nas águas dório,tentando ver em seus olhos e sentir em si mesma aquilo que um dia sentiu.Ali então,aquela mulher enxergou no seu rosto a lembrança do rosto do alguém que ela desejou ter,do alguém que ela sentiu amar.
Não afundou no rio.As memórias jamais estiveram afogadas,ainda que não estivessem na superfície.
As lágrimas angustiadas eram de lembranças que lhe faziam saber quão preenchida era a sua alma.Lembranças que agora,ela desejava guardar para sempre.
“Eu não irei esquecer, e nada irá tirar”
Porque a dor de amar forma a mais bela cicatriz existente no que se chama viver.
Ela então adormeceu ali,sabendo que no outro dia o sol queimaria e iluminaria de novo a sua pele. E então saberia o significado de estar viva.



Calliandra S. Ramos.



[Essa é uma História tida numa cidade longe daqui,quando eu só consegui dormir depois de contemplar tanta tristeza nas luzes dos arranha céus.Pensando...]

Beijos. ;*

3 comentários:

Calli disse...

http://www.angelfire.com/co2/dventre/nomes.html

Paula Daniele disse...

Caaaaalli *_* que história perfeiiita *___* adorei mesmo minha escritorinha de gaveta fovoriita.
Fiquei tão inspirada e enquanto lia imaginei cada detalhe!
Parabéns meu amooor, vc escreveu um conto maravilhoso *_*

Te amo amiga!

Anônimo disse...

Gostei muito, Calli. *-* Acho que sentir é muito mais difícil que pôr em palavras, grande trabalho. *-* [Hannah